A palavra "morte" sempre traz a presunção de um fim de um ciclo, da cessação da existência de algo que antes possuía energia própria e, claro, vida.
Se traçássemos o paralelo entre a saúde de uma pessoa e a prática do xadrez como um esporte nos últimos anos aqui na região, chegaríamos às seguintes situações: em Avaré o xadrez estava em estado vegetativo, acordou do coma no ano passado e está saindo da UTI agora; em Bauru, estava em situação semelhante, mas a recuperação foi mais rápida e já está internado em quarto normal, sob medicação; São Manuel ficou um tempinho doente, mas já melhorou um pouco; Taquarituba era um embrião que cresceu, virou bebê, engatinhou e agora já está aprendendo a andar; Ourinhos é um bebê recém-nascido; Itararé está com a saúde em dia e Itapetininga está começando a sair do coma. E Itapeva? Bom, em Itapeva, MORREU COM FALÊNCIA MÚLTIPLA DE ÓRGÃOS.
Morei em Itapeva entre 2002 e 2015 e lá fiz várias amizades em razão do xadrez. Nessa época ainda praticava xadrez de forma intensiva e alguns meses depois de fixar residência lá, fiquei sabendo que o Serginho Panis, o cara que fazia e acontecia no xadrez local, estava promovendo um torneio de xadrez num clube da cidade. Fui lá e me inscrevi. Logo de cara, ele me apresentou o Arthur, com 15 anos na época, uma revelação do xadrez itapevense. Não me recordo qual abertura usei contra ele, só me lembro que joguei de brancas e venci a partida, muito tensa e marcada por lances táticos. Depois disso, enfrentei um adversário a cada semana e acabei empatando com o próprio Serginho, era um torneio pensado. No final das contas, o torneio não terminou pois era em sistema Schuring (Round Robin) com muitos jogadores e todos acabaram cansando.
Nomes como Carlos Roberto Santine, Claudinei Polaco, Adriano Braatz, Alexandre Gaspar, Osvaldo Seco, Daniel Vasconcelos e Paulo Baré, além do próprio Serginho Panis eram os aficcionados que mantinham o xadrez itapevense, sendo que este era o que coordenava os torneios e eventos na cidade. Isso tudo num ciclo que retornou em 2005 e perdurou até 2007, aproveitando o "boom" enxadrístico que ocorria em Itapetininga, promovido pelo enxadrista Roberto Suardi.
Foi uma época muito bacana com muitos encontros, viagens e partidas legais.
Foi nessa época em que representei Itapeva por duas vezes nos Jogos Regionais em 2006 em Itapetininga e em 2007 em São Roque.
A coisa começou a desandar em meados do ano de 2007. Antes dos Jogos Regionais, Serginho Panis iniciou um outro torneio pensado, mas uma série de ações causou descontentamento entre os participantes: além do fato de ser um torneio sistema todos-contra-todos, era comum os atrasos e as faltas nos horários designados para as partidas, sem que fosse anotado o WO e pesou a falta de know-how para gerenciar as faltas e o torneio em si. No final das contas, o torneio não terminou.
Meses antes das inscrições dos Jogos Regionais em 2007, Serginho Panis veio ao grupo propondo que os jogadores de Itapeva representassem a cidade de Nova Campina. Uma parcela aderiu à proposta de Serginho, enquanto os demais formaram outra equipe para defender Itapeva. O resultado disso tudo foi um racha que não teve mais volta.
Terminados os Regionais em 2007, tudo parou. Não houve mais reuniões, viagens, torneios, mais nada.
Em 2008, Serginho Panis promoveu um torneio na Escola Mauro Albano em Itapeva, que redundou em fracasso com apenas 08 inscritos. Desde então, desanimou a promover o xadrez em Itapeva.
Por anos não se falava mais de xadrez em Itapeva. Somente houve uma exceção em 2012, quando o uma gincana promovida pela Secretaria que lembraram de mim, do Adriano Braatz e do Alexandre Gaspar, mas foi só.
E para acabar de vez, um dos mais fortes jogadores, Adriano Braatz, morreu num trágico acidente de carro na Rodovia SP-258, em Taquarivaí. Foi a pá de cal.
Depois disso, não se falou mais de xadrez em Itapeva, com exceção de 2014, onde um grupo de jogadores, supostamente universitários do campus da UNESP, defendeu a cidade na 2ª Divisão dos Jogos Regionais em Sorocaba, tendo classificado para a 1ª Divisão . Itapeva também participou em 2015 e 2016, na 1ª Divisão em razão das regras dos Jogos Regionais, porém sempre amargando as últimas colocações. Frise-se que não há um trabalho para xadrez de competição por parte desses jogadores, apenas disputam os Regionais, diferente do que ocorre nas outras cidades, onde há um trabalho de clube, etc.
O que digo que ocorreu em Itapeva é que o xadrez não era tratado com absoluta prioridade por aqueles que o praticavam. Muitas vezes marcavam-se os encontros e as pessoas faltavam priorizando outras atividades. Alguns enxadristas migraram para o poker, fenômeno que vinha ocorrendo há alguns anos. Havia muita discussão a respeito do formato de torneios e não havia um projeto de evolução. Os encontros geralmente eram em casas e locais privados, desestimulando os jovens e os de fora se agregarem ao grupo e isso causou a fuga de jogadores.
E por essas razões, acredito que o xadrez morreu em Itapeva.
NOTA DO REDATOR: O Arthur, aquele garoto que eu citei no começo do artigo e era a revelação de Itapeva, contra quem eu ganhei na minha primeira partida logo que comecei a jogar lá, continuou no xadrez e tornou-se um baita jogador. Nós nos encontramos em Piracicaba na 39ª Etapa do Circuito Solidário onde ele, representando Diadema ficou na 5ª posição. Ele tem disputado uma cacetada de torneios e possui rating FIDE. Quem quiser dar uma olhada no perfil dele no site da FIDE é só conferir aqui
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